Enecult é um encontro multidiciplinar em cultura que acontece todos os anos em Salvador. O evento já se consolidou como um dos principais para discussões e apresentações de estudos culturais no Brasil. Sediado na UFBA (Universidade Federal da Bahia) e realizado pelo CULT (Centro de Estudos Multidiciplinares em Cultura). Possui diversos eixos temáticos como cultura e desenvolvimento, cultura e identidades, entre outros.
Este ano a Evoé foi tema do trabalho “Crowdfunding e Lei Rouanet: um olhar para o impacto de ações coletivas no cenário brasileiro”, apresentado no dia 15 de setembro, no GT de Cultura e Desenvolvimento desse encontro. No trabalho, além de um apanhado histórico da mais importante lei de fomento cultural no Brasil (a Lei Rouanet, Lei nº 8.313/91), também foi discutido os resultados do projeto Documentário Nonô.
Neste post iremos te contar o que foi discutido lá. Vem com a gente! 😉
Na abertura do Enecult, um dos principais teóricos e estudiosos da cultura no Brasil, Muniz Sodré (professor emérito da UFRJ) discutiu sobre A cultura como crise. O professor começou sua fala refletindo sobre o que é cultura. Temática que já discutimos aqui no Blog.
Assim como escrevemos no Blog, Sodré lembra que a palavra se deriva do verbo “cultivar”. Acredita-se que a agricultura e o processo de registros surgiram bem próximos e foram importantes para o desenvolvimento da cultura e da própria sociedade. “Cultivar a terra, o espírito e a alma” define o professor, lembrando o significado da palavra.
Com o desenvolvimento do capitalismo, a cultura passa a ser também mercadoria, gera trabalho e exploração. Agora como um produto vendável, preocupa-se em gerar lucro, corresponde a uma ordem mercadológica.
A mudança de perspectiva, no entanto, gera algumas perdas. Se antes a cultura poderia ter uma tônica espiritual e identitária, quando ele se torna mercadoria esses quesitos se enfraquecem. O capital tende a criar produtos que sejam fonte de renda infinitos e acaba retirando a naturalidade e organicidade dos movimentos. Dessa forma, a cultura na cidade funciona como um polo de investimentos, visados principalmente com megaeventos, bairros estilizados e festas que atraem públicos consumidores.
O professos também faz um paralelo com o conceito de crise para o mercado e para o meio cultural. Enquanto para o capital, crise significa destruição, miséria e perdas; no ambiente cultural a crise se ocasiona quando há mudança, encontro de outras formas de ver o mundo e significação. No meio cultural a crise é benéfica, porque indica que algo está mudando, que começamos a pensar diferente e ver outras perspectivas. Em contrapartida, para o capital a crise é maléfica, gera retração e atraso.
Sodré conclui percebendo que a lógica cultural não corresponde com a lógica do capitalismo, pois o capitalismo não se relaciona bem com a crise, ao passo que a cultura tem na crise uma grande importância para o desenvolvimento.
Baseado em dados analisados da Lei Federal de Incentivo a Cultura (Lei Rouanet) e do Ministério da Cultura, constituiu o trabalho “Crowdfunding e Lei Rouanet: um olhar para o impacto de ações coletivas no cenário brasileiro”. A ineficiência da Lei se dá principalmente pelo valor arrecadado e pela concentração dos recursos da Lei.
Por um lado os R$13,5 bilhões de reais arrecadados de 1995 a 2011 parecem contradizer a condição de ineficiente. Por outro, esse valor representa menos de R$71 por pessoa acumulado nesses anos. Isso significa que a cada ano foi investido somente R$ 4,18 por habitante para a cultura pela Lei Rouanet.
Os valores arrecadados ainda estão concentrados na região sudeste, que detém 80% dos recursos captados. A região Norte, na contramão possui a menor porcentagem dos recursos da lei, apenas 1%. A concentração também se dá nas categorias em que 39% dos recursos vão para música e artes cênicas.
No trabalho também ficou evidente a desinformação dos brasileiros. A maioria, 84%, não sabe que pode destinar imposto para cultura. Esse é um direito para toda pessoa física que faz declaração completa pode destinar até 6% para projetos da Lei Rouanet. Pessoas jurídicas também podem destinar 4% do Imposto se declaram lucro real. Se toda pessoa física que faz declaração completa destinar 6% de seu imposto para a cultura seria possível arrecadar R$4bilhões. No ano passado, a Lei captou cerca de R$1bilhão.
Enquanto os recursos na Lei Rouanet parecem estagnados, no crowdfunding a arrecadação é crescente no Brasil e no mundo. A América Latina arrecadou cerca de U$57,2mi no ano de 2015, o que representa um crescimento de 167%. Foi exatamente por isso que a Evoé surgiu.
Percebendo o crescimento do crowdfunding e as potencialidades da Lei Rouanet, a Evoé mescla as duas modalidades de fomento à cultura. Assim, pessoas físicas podem destinar seu imposto de renda em projetos aprovados pela Lei que estão cadastrados na Evoé.
Um dos primeiros projetos cadastrados na Evoé incentivados pela Lei Rouanet foi o Documentário Nonô. O projeto aborda a relação dos belo-horizontinos com os bares da capital mineira e registra as histórias do Bar do Nonô, localizado no hiper-centro de Belo Horizonte.
Antes de cadastrar na plataforma, os idealizadores do projeto haviam tentado diversos editais. Evidentemente, eles não foram aprovados neles. Foi quando eles procuraram a Evoé e apresentaram a ideia. Aqui, estimulamos que eles cadastrassem na Lei Rouanet. Ao contrário do que se imagina, a Lei é muito simples e fica aberta o ano inteiro. Durou no máximo 3 meses todo o processo até a aprovação.
Uma vez chancelados pela Lei de Incentivo a campanha foi lançada. O projeto arrecadou R$ 25.197,00 por 151 apoiadores (101% do que foi pedido). Dos apoiadores apenas 30 destinaram Imposto de Renda, entretanto eles representaram 53% do valor arrecadado.
O Enecult reuniu vários pesquisadores e estudiosos de diversas áreas para discutir sobre cultura. Economia, comunicação, gênero, artes, literatura foram algumas das áreas de pesquisa dos trabalhos. Alguns dos temas trabalhados já estão disponíveis nos anais do evento. É o caso do trabalho que tem a Evoé como tema, disponível aqui, dê uma olhada. 😉
É quase impossível falarmos de tudo o que foi discutido no evento. Mas colocamos alguns temas que achamos mais importantes.
Deu aquela vontade de ter um projeto caso de estudos acadêmicos? Comece já seu projeto na Evoé, que juntos fazemos história! 😉